segunda-feira, 6 de junho de 2022

A Grande Viagem

"Até a jornada de mil milhas começa com um pequeno passo."

Provérbio japonês.


Na margem do Rio Sumida.
Ao fundo, a cervejaria e o Skytree.

Sabe quando você ficou em quarentena, em casa, e chegou uma hora que não tinha mais o que fazer? Você já tinha faxinado todos os cantos da casa; organizado as peças do seu guarda roupa por cores, tamanhos e tendências de cada estação; já estava até fluente em um novo idioma; já tinha zerado a Netflix; e lido a Enciclopédia Barsa duas vezes? Essa sensação alguns japoneses já conheciam. Quando estive no Japão, em abril de 2019, era Golden Week, um feriadão que acontece todo ano. Mas, daquela vez, ele foi ainda maior, de 27 de abril a 6 de maio, totalizando 10 dias de folga. Além dos sábados e domingos desses dias, e os feriados que já são normalmente um atrás do outro (Dia da Constituição, Dia do Verde e Dia das Crianças) eles têm o costume de compensar feriados - quando um feriado cai num domingo, ele é transferido pra segunda-feira. Nesse meio tempo também havia um acontecimento raro, que era a ascenção do novo imperador. Numa terra onde as pessoas pensam bastante em trabalhar, esses dez dias de folga na prática não era pra todos, porque as lojas, restaurantes e diversos serviços que eu usei estavam sempre abertos, parecia estar tudo funcionando perfeitamente.


Em Tóquio, fiquei hospedado bem perto do Skytree, na região de Sumida (eu ria com esse nome) então foi a primeira região que conheci. Skytree é uma torre com um mirante a 155m de altura, entrada 2.500 yenes com opção de mais 1.700 yenes por passeio guiado de 50 min. Existe também um passeio onde falam exclusivamente sobre a construção do prédio: dura 40 min e custa 1.000 yenes. Em abril de 2019, a cotação de yen pra real ficou mais ou menos assim: 1 yen = R$0,04. O jeito que eu calculava e chegava num valor muito próximo era: cortava os dois últimos algarismos da direita e pensava em dólar. 2.500 yenes então seriam o mesmo que US$25. Em abril de 2019, US$1 era praticamente R$4,00. Logo, 2.500 yenes eram R$100,00, preço do mirante; com passeio guiado: R$168,00. Voltando: o Skytree é a torre (eu disse torre e não prédio) mais alta do mundo, então talvez até seja uma coisa que vale a pena. Mas a cidade tem outros observatórios gratuitos (embora mais baixos) que já nos deixam satisfeitos, sem precisar desembolsar um yen. É uma pena que depois da pandemia que sofremos talvez os preços das coisas tenham sofrido alteração demais. Lamento que talvez você não consiga se basear nos preços que ponho aqui, caso esteja lendo este texto com o propósito de ir pro Japão.

Observatório do World Trade Center - grátis.

Já o hotel onde fiquei tinha o quarto tão pequeno, que era menor do que a cabine interna de navio de cruzeiro. Nem desfiz a mala. Eu até tinha a impressão de o banheiro balançar um pouco. Tóquio é a metrópole mais populosa do mundo (imagina a população do Canadá toda numa só cidade. Então, é lá). Logo, os japoneses precisam economizar espaço em tudo, a ponto de até parecer que existe uma cidade subterrânea. Sim, aconteceu comigo de descer uma escada em uma praça de alimentação pra ir ao banheiro e parecia que eu estava andando quarteirões e mais quarteirões debaixo da terra. Talvez você encontre até subsolos de dois andares. Sim, dois pisos abaixo do nível da rua, e, às vezes, bem compridos. Outra coisa curiosa é que há uma preocupação já internalizada com o fluxo e com o movimento das pessoas por qualquer espaço. Há muita sinalização indicando onde você pode ou não ficar e, dependendo do evento, há até pessoas para direcionarem as outras a não interditarem o caminho dos outros. Não fui a nenhuma milonga (baile de tango) em Tóquio, porque as entradas de todos os lugares que achei passavam dos R$100,00, enquanto que em Buenos Aires, a gente paga R$8,00.

Templo Senso Ji, em Asakusa.

Parecia que a cidade toda tinha resolvido
rezar no Templo Senso Ji naquele dia.

No segundo dia, explorando Sumida um pouco mais, vimos uma padaria com uma fila meio grande e pensamos: “Se tem tanta gente, é porque é bom”. Observamos o que as pessoas estavam comprando e era um doce de batata doce incrível. A intenção depois desse café da manhã era comprar entrada do passeio de barco, da Tokyo Cruise, cujo preço esqueci, mas que dura 40 minutos e a estação é do lado do metrô Asakusa. Muita gente visita também o templo Sensoji, ali perto, grátis também e que estava bem tumultuado, mas vale a pena. Recomendo tomar um sorvete de chá verde (350 yenes, bem fácil de achar em qualquer lugar), sentar no fundo do barco, porque aí você tem a visão igual dos dois lados da margem do rio, não fica aquela sensação de estar privilegiando uma vista e ignorando o outro lado por completo. Se bem que os prédios que margeiam o Sumidagawa River são meio parecidos dos dois lados. O legal do passeio é que o barco passa por debaixo de várias pontes. Desci em Shiodome, já outro bairro, e visitei o observatório do World Trade Center, grátis. Desci e fui andando ao bairro de Ginza.

Uniqlo vista do terraço do Ginza Six.

A área de Ginza é onde estão as grande lojas de marcas, até fiquei imaginando se ali não seria um dos metros quadrados mais caros do mundo. De todo o planeta, a loja da Uniqlo que tem mais andares está lá, total de 12. Eu não conhecia Uniqlo e acabei me identificando muito com essa marca. É bem popular, preço ok, as peças são bonitas, simples e com ótimo caimento. Comprei uma cueca e uma camiseta. Mas mesmo que você não goste de ficar olhando vitrine, visitar Ginza vale muito, principalmente no domingo, quando a Avenida Chuo Dori está fechada e vários artistas tomam a rua, mais ou menos o que acontece na Av. Paulista, em São Paulo. Suba no observatório do shopping Ginza Six, que lá você tem uma visão 360 graus da região. Interessante mesmo que seja só de uns oito andares mais ou menos. Quanto às lojas, a área de Harajuku é mais interessante porque é cheia de brechós. Eu mesmo que não sou muito ligado em roupas, acabei comprando duas camisetas e um shorts num dos brechós.

Parece que a cidade toda também gosta 
de comprar em Harajuku.

E como se deslocar? A pé, é fácil, você só terá de pensar se vale a pena com relação à distância que for percorrer mesmo. Mas fique atento aos ônibus gratuitos (free shuttle bus). Ele é um ônibus comum, não se destaca muito entre os outros, mas as paradas estão sinalizadas com uma placa vermelha. Eu demorei a descobrir isso, então só peguei um, que passa perto da Tokyo Station, mas existem outros três (em Marunouchi, em Nihonbashi e am Tokyo waterfront subcenter), mas repesquise a respeito, pois pode haver novidades a respeito dessas linhas. Sobre o transporte público regular, recomendo que você compre um cartão Pasmo ou Suica numa das máquinas das estações. Eles servem pros ônibus também e pra muitos tipos de transporte até em outras cidades japonesas, não somente Tóquio. Com eles, a tarifa fica mais barata, sem contar que você não precisa ficar avisando à pessoa do caixa sobre o local onde você vai descer, já que a tarifa lá varia de acordo com o tamanho do seu deslocamento. Quanto mais longe do seu embarque a estação for, mais cara a passagem vai ficando. Suponhamos que você não tenha o cartão e, no meio do caminho, resolva descer num lugar diferente? Aí, na hora de sair, terá de ir à bilheteria de novo e explicar que você comprou o bilhete pra descer num determinado lugar, só que resolveu descer em outro. Se você for fluente em japonês, até acho que isso não seja um grande problema. Só que, no Japão, você encontrará pouca gente pra falar inglês com você. Agora imagine tendo de se virar pra explicar uma situação dessa por meio de gestos. Em suma: compra esse cartão, que a passagem até fica um pouco mais barata. Outra vantagem: ele serve pra você fazer compras também. Tem muitas lojas com o selo Suica ou Pasmo no caixa. Isso significa que ali ele vai funcionar como um cartão de débito mesmo. Os japoneses são fera na praticidade. Então, encha esse seu cartão com créditos, sem medo, e use no metrô, no ônibus, no supermercado... E se chegar a hora de deixar o país e ele estiver cheio ainda, vá à bilheteria de alguma estação, devolva-o e pegue seu dinheiro de volta. Mas atenção: ao devolver, 220 yenes (R$8,00 na época em que fui) ficam retidos. Então, o melhor é conseguir usar tudo mesmo e trazer o cartão vazio de lembrança. Ficou pasmo com tanta novidade? Eu também.

Criatividade japonesa na moda.

O bairro de Akihabara é a capital mundial dos eletrônicos dos mais diversos tipos. Animes, vídeo games, mangas, são coisas muito fortes na cultura japonesa, então é um bairro muito interessante de se conhecer também. Foi lá que eu realmente entendi o quanto os jogos eletrônicos e os mangás são algo tão importante na cultura deles. Eu joguei Street Fighter num Super Nintendo de graça no meio da rua! E perdi pra uma criança de uns dez anos, acho. 

Cosplays de Mario Kart cruzam por você 
todo o tempo.

Falando em mangá, é comum você ter a sensação de que está dentro de um às vezes. Dá pra ver a turma do Mário Kart passando por você quando for atravessar a rua, e várias atendentes de loja que parecem ser irmãs da Sailor Moon. Uma curiosidade que percebi lá é que as mulheres acham sensual andar com os pés virados pra dentro. O que, pra mim, é uma falta de consciência corporal na pisada, para elas é uma arma de sedução, muitas se forçam a ter a pisada pra dentro, então verá muitas japonesas andando com os joelhos levemente apontando um pro outro.

As comidas das vitrines são réplicas não comestíveis
do prato que o estabelecimento serve.

Chegou a hora de dizer “sayonará”? Então, preste atenção aos procedimentos aeroporturários. Eles são mais rigorosos com o peso da mala e o número de volumes que você carrega. Então vai ser mais difícil sua mala de mão passar meio desapercebida se for grande. Se eles desconfiarem, vão pesar mesmo. E na bagagem despachada não pode ter nenhuma bateria. Minha amiga foi chamada no alto-falante por conta disso. Teve de abrir a mala e retirar a bateria. Para ir pro aeroporto, compensa mais o metrô mais lento, porque, a partir da estação Shimbashi, por exemplo, ele leva 80min em vez de 50min (comparado ao trem expresso), mas custa a metade do preço e te deixa dentro do aeroporto de Odaiba também. Por uma diferença de tempo de só meia hora, acho que vale a pena a economia. Entre um terminal e outro dá até pra ir a pé mesmo. Vale lembrar de que o Japão está na lista dos países mais caros que já visitei. Pelo menos a água da torneira lá é saudável, então esse será um gasto a menos. Se você chegou até o final do texto, Arigatô (outra palavra que aprendi a falar em japonês).

West Exhibition Hall, em Odaiba.