quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Somos Todos Irmãos

"Estou convencida de que haverá paz entre Israel e seus vizinhos porque milhões de árabes precisam da paz tanto quanto nós. Uma mãe árabe que perde seu filho no campo de batalha chora tão amargamente quanto uma mãe israelense na mesma condição".
Golda Meir, ex-primeira ministra de Israel

Por do sol em Yaffo

Tel Aviv é daquelas cidades em que, numa virada de quarteirão, você muda da vida moderna e agitada do século XXI para um lugar tão antigo que parece até que a gente está num cenário bíblico (só que a gente está mesmo, literalmente). É virar a esquina e ter a sensação de que entrou na máquina do tempo. Cheguei já querendo viajar no tempo e fui para Yaffo (às vezes escrito como Jaffa), lanchei na Abouelafia, uma padaria tradicional, em funcionamento desde 1875, e caminhei pelos vários corredores do bairro, em meio a pequenos prédios que já têm mais de mil anos, com portas muitas vezes misteriosas, que nos fazem pensar como é ter o privilégio de se morar num lugar assim.
Orla movimentada, mesmo à noite

Yaffo é um bairro caro de se morar e que tem muitos artistas e ateliês, lembrando um pouco a atmosfera que tem Santa Tereza, no Rio de Janeiro. Desci aqueles corredores da época de personagens bíblicos circuncidados (será que algum deles morou ali?), até sair num dos portos mais antigos do mundo, com mais de 2000 anos em atividade, onde vi o sol se por, no mar. Passear por ali é cruzar com turistas, pescadores e navegantes. Há muitos restaurantes, e, na minha primeira noite, por 100 shekels, comi pães de pita com os mais diferentes aperitivos e pastas para acompanhá-los. A porção é enorme e dá para dividir entre duas ou três pessoas. Um shekel, hoje, é R$1,20. Deu pra sentir o drama de como é caro viajar pra lá, né?

Lanchinho da primeira noite na cidade.
Será que vale R$120,00?
Shak shuka, prato super típico.
  
No dia seguinte, fui para a outra ponta da praia de Tel Aviv, onde está o porto novo, menos turístico que Yaffo, mas não menos movimentado. É mais frequentado por habitantes locais do que por turistas, ainda mais durante aquela temperatura de início de outubro, de sol forte, mas tempo fresco. Essa área da praia passou a ser usada como porto para se evitar alguns problemas que Yaffo tinha. Mas o novo também não deixou de ter seus probleminhas, como possuir um aeroporto ao lado, e muitos aviões passarem raspando pela sua cabeça enquanto você tenta tirar um cochilo na praia. O mar é mais revolto, o que torna meio complicado também o acesso a algumas embarcações e há trechos recomendando as pessoas a não mergulhar.

Crianças circuncidadas brincam livremente pelas fontes do porto
O porto novo é muito agradável, mais parece um parque, praça ou algum outro lugar de lazer do que um porto, graças a uma ideia de políticos que quiseram evitar a burocracia que tanto atrapalha alguns projetos de irem adiante. Foi proposto a donos de grandes lojas e restaurantes que revitalizassem o local em troca de um aluguel barato por alguns anos. Eles ocuparam os grandes galpões, que já tinham servido como feiras, sede de orquestras, garagens e até base militar britânica. E espontaneamente o público passou a frequentar, até virar tudo o que é hoje, um grande complexo cultural e comercial, e os estabelecimentos que ocupam esses pavilhões são dos mais diversos tipos, justamente para que o local seja frequentado por todas as pessoas, circuncidadas ou não. Há restaurantes mais caros, mas também tem as barraquinhas onde você pode apenas comprar um sorvete e pronto.

Falaram que circula chocolate dentro desses tubos aí...
Bem famosa em Israel, a Chocolateria Max Brenner pensou em algo para tornar a experiência do consumidor mais íntima com o local, fazendo de seu espaço de consumação o mesmo espaço onde você vê o chocolate sendo fabricado. Suas xícaras são dos formatos mais diversos – uma xícara de chocolate picante sai a 24 shekels, preço igualmente picante. Mas esse passeio pode não ser caro, se não quiser, porque o espaço do porto é enorme para caminhar e admirar o mar e o povo israelense. O piso é ondulado; imita o movimento das ondas, o que atrai as crianças para andar de patins e skate; é de madeira e tem vãos, para as ondas passarem em caso de cheia. Os assentos têm formato de pedra. A arquitetura realmente conversa com a natureza. O porto tem um passeio guiado gratuito e muito do que escrevi aqui aprendi durante ele. Há outros pela cidade, é só verificar em https://www.freetour.com/tel-aviv.



É verdade esse bilete!
A caminhada entre esse porto moderno e porto histórico de Yaffo é de 4,5 km de orla e te revela uma Tel Aviv surpreendente: academias ao ar livre; estátuas de praticantes de yoga; guarda-sois sempre brancos, seguindo padrão; parques com área reservada a usuários de maconha; praia reservada a cachorros (dog friendly); uma pequena área com guarda-sois coloridos, indicando a praia gay; aula de dança israelita grátis uma vez por semana; e o Café Aroma (famoso em todo país), com uma salada grega deliciosa de 40 shekels (sabor delicioso e preço salgado). Só faltou a área de nudismo, que até tem, mas é mais afastada (Praia de Gaash) e não é oficialmente uma praia naturista. Apenas há o costume por parte de alguns de se praticar o naturismo por ali. Costumes e pensamentos que quebram bastante a expectativa de quem está visitando a “terra santa”, não acha? Parece que o israelense recebe todos de braços abertos.




A 2,5 km do Café Aroma, você tem outra opção de refeição, no Shuk Ha-carmel (shuk quer dizer mercado). Suco de romã, de cenoura e de amêndoas são os mais tradicionais. Para comer, recomendo o shak shuka, que são ovos cozidos ao molho de tomate, acompanhados com pão. De sobremesa, halva (129 shekels o quilo), um doce a base de gergelim que, em alguns locais do Brasil, é chamado de raleu . O preço é de se espantar, assim como assusta a variedade de frutas locais, produzidas por uma nação construída sobre o deserto. Não entendi como uma cenoura conseguia dar tanto suco. O Shuk Hacarmel também é um bom lugar para comprar lembranças. Toda terça e sexta o lugar se torna especial por ter também uma feira de artesanato, muitos artistas circuncidados na rua, e seguranças circuncidados revistando todos que entram na área e pedindo para abrir e mostrar a bolsa. O país tem tanto histórico de eventos terroristas, que, em qualquer local onde há reunião de pessoas (também em rodoviárias e shoppings), as pessoas são revistadas e obrigadas a passar pelo detector de metais. A hospitalidade é boa, mas é melhor "não tentar o Senhor seu Deus", né?
Shuk Ha-carmel
Um desses lugares é o Mercado Sarona, que também já sofreu atentando. Sarona é o nome de todo o complexo, que, além de mercado (mais gourmetizado que o Shuk Hacarmel), é um centro de lazer ao ar livre, com playground, um grande gramado, restaurantes. O local era do exército e foi revitalizado para se tornar um dos vários locais de lazer de Tel Aviv. É de se admirar como os ataques não amedrontam o povo e não deixam todos trancados em casa. O estilo de vida lá parece ser justamente o de estar na rua e confraternizar uns com os outros.

Tomates e pimentões das mais diversas cores...

...no Shuk Ha-carmel


 




















Para outro tipo de compras, roupas caras no caso, vá a Kikar Hamedina (Praça do Estado, em tradução livre), e preste atenção aos prédios residenciais que circundam a praça e como é interessante sua arquitetura (só a arquitetura mesmo, porque a jardinagem, dessa praça, é muito mal cuidada). Os prédios quase que parecem um triângulo invertido, mais um trabalho do brasileiro Oscar Niemeyer que ganhou o mundo. O piso térreo desses prédios é sempre um comércio e os outros pisos acima são residenciais, mas essa recomendação de local faço mais a título de curiosidade. Talvez a única parte de Tel Aviv das mencionadas, que, se você perder, não fará a menor diferença.

Arquitetura de Niemeyer na Praça do Estado

Há planos de Tel Aviv ter um metrô até 2021. O projeto está explicado numa réplica na Alameda Rothschild, mais residencial, muito larga e arborizada, com redes sob as árvores para qualquer um se deitar. Tel Aviv não é uma cidade grande, dá para se fazer muito a pé. Ou consultar o Google Maps para saber sobre os ônibus ou sheruts (vans), cujo preço varia de cinco a oito shekels. Bem caro, né? Isso significa uns R$10,00 por um ônibus circular. Deixe para pegar táxi no shabbat (dia de folga em Israel), que começa no por do sol de sexta e vai até o por do sol do sábado, e quando o transporte público não funciona. Boa viagem e Shalom!

Não faça barulho nos ônibus
pra não perturbar o motorista.

Calçadão perto da Praça do Estado

E se algo der errado na sua viagem, lembre-se de sempre se perguntar: "Se eu fosse Elvis, o que eu faria?".





E se tudo estiver ok, faça pole dance: