domingo, 12 de dezembro de 2021

Caminho das Índias

"As boas coisas vêm quando estamos distraídos."

Provérbio indiano.







Uma semana depois de ter saíde de Dubai e ter passado por Abu Dhabi, Ilhas Sir Bany e Mascate , sobre diferentes cores do Mar Arábico, o MSC Splendida se dirigia às Índias, com seus 333m de comprimento, 38m de largura e 67m de altura; sua capacidade para 4.363 hóspedes e 1.370 tripulantes (funcionários); 25 elevadores, 5 piscinas e seu plano de wifi que nem louco eu compraria:

Planos de R$500,00 a R$1.000,00. Escolha o seu.


Quando chegou a hora de descermos na Índia, não sei direito o que senti, porque, ao mesmo tempo que sinto pela Índia uma grande curiosidade, sinto também medo, porque eu tenho uma impressão de que tudo lá é feito com falta de higiene. Eu sei que essa frase ficou meio preconceituosa. O quinto porto do MSC Splendida foi Cochim, onde ficamos por dois dias e uma noite. Uma coisa eu decidi: não comer NADA fora do navio, porque são muitos os relatos que escuto de turistas que passam muito mal depois de comer qualquer coisa na Índia. Eu tomava um café reforçado no barco e levava na bolsa coisas práticas, como ovo cozido, maçã e banana. A única coisa que comprei pra consumir foram uma Seven Up por 35 rúpias indianas (IRN) e água de coco por 50IRN, numa data em que 70IRN eram iguais a um dólar em abril de 2019; e um dólar era quatro reais. Pois é... Em alguns países eu acho mais fácil fazer a conversão assim, passando por outra moeda até chegar no real, porque as moedas que o mundo inteiro conhece são dólar americano e euro. Pensando de outra forma, 1IRN estava igual a R$0,06, e assim ficou até o final do ano. Então meu refri custou R$2,00 e a água de côco... Ah, uns três reais e alguma coisa; foi menos de quatro, então tava num preço ótimo. Mesmo assim, fiquei com um pouco de mede de beber esse côco porque “e se aquele instrumento usado pra abrir o côco tivesse meio sujo?”. Ainda bem que não deu em nada. Graças às minhas atitudes preventivas, saí da Índia com o estômago intacto.

Comprei um desses, mas de madeira.

Uma coisa me fascinou em Cochim: o artesanato. Foi a parada onde mais gastei. Já pensando em reais, foi um elefante de madeira do tamanho de uma mão adulta fechada por R$50,00 (no começo, o vendedor disse que eu teria de levar dois, por R$260,00); uma calça por R$20,00 (o vendedor tinha me oferecido por R$40,00) e um carrinho de fricção réplica de um tuktuk, que levei por R$15,00, porque achei um desaforo pagar os R$40,00 que ele queria. Viu? Ao pechinchar na Índia, peça menos da metade do que te pedirem. O dinheiro troquei por lá mesmo, e a taxa foi a oficial, não fizeram trambique.

Os vendedores da Índia são menos chatos insistentes do que os vendedores dos países árabes. E era mais fácil de se barganhar com eles; eu consegui descer mais o preço e pagar muito menos do que o preço inicial oferecido. Spoiler de uma dica: na China, a mesma tática funciona: insista para descerem o preço até a metade do primeiro preço que te deram. Nas duas situações, falo dos vendedores de rua. Em Cochim, uma curiosidade que eu não vi em lugar nenhum: lojas hassle free, que significa que, nelas, você pode circular à vontade, que nenhum vendedor ficará atrás de você oferecendo nada. Hassle significa incômodo em inglês.

A bordo de um tuk tuk com meu motorista particular indiano.

Em toda chegada de porto em todos os países por onde o Splendida passou, sempre a mesma coisa: passar pelos procedimentos de imigração, que sempre variam – tem vez que precisa preencher papelada; tem vez que não. Em Cochim, uma coisa achei curiosa: não havia a opção de descer do navio apenas no segundo dia – ou se descia nos dois dias ou apenas no primeiro, porque as pessoas da imigração só trabalhariam no primeiro dia. Como sempre, assim que se pisa um pé em qualquer território, todo mundo já quer te empurrar alguma excursão. Até que lá eu não achei caro: US$30,00 de táxi por quatro horas ou US$15,00 no tuk tuk por quatro horas também com duas opções – ou a cidade nova ou o centro histórico. Escolhemos a cidade antiga e nosso motorista e guia foi o Ramanan. Ele falava pouquíssimo inglês, então foi parando nos lugares que acreditava que fôssemos gostar, como uma lavanderia (!), afinal, toda vez que visito um país diferente, faço questão de saber tudo sobre as lavanderias (ironia em itálico). Veja como é a da Índia:

Na verdade, estava brincando. Eu achei interessante a parada da lavanderia porque realmente eu nunca tinha visto que esse serviço pudesse ser prestado da maneira que vi. Achei divertido. No segundo dia do meu passeio com Ramanan, a rota era a cidade nova. Pedi para parar num shopping, pra ver como é lá. Não sei se ele não entendeu bem ou se shopping pra eles é o que aqui nós chamaríamos de galeriazinha – só tinha loja de celular. Só! Sem exagero. E todo o caminho que ele fazia nesse segundo dia foi meio decepcionante. Nada me atraía, não sentia de vontade de descer em lugar nenhum. Ramanan parou em lojas de artesanato, eu dava uma olhadinha e saía. Acabei não passeando as quatro horas. Voltei pro conforto do Splendida:

Piscina e jacuzzis cobertas.

Esse relato da viagem nas Índias foi pra mostrar que nem tudo atinge nossas expectativas. Tanto Cochim quanto as Ilhas Sir Bany foram paradas sem muita graça dessa viagem. O problema é que visto para Índia custou mais de R$300,00 e só vale por um ano. Então eu paguei uma fortuna (pelo menos eu considero que 300 contos são uma fortuna) pra não aproveitar direito.

sábado, 13 de novembro de 2021

Destino

"Quando você se abre pro desconhecido, você aumenta a fé no ser humano."

Frase do projeto Yuujou, adaptada por mim.


Grande Mesquita do Sultão Qabus, em Omã.

Já fiz um texto sobre como é viajar num cruzeiro e, pra quem viaja na primeira vez, é sempre muito comum se assustar com tanta coisa que cabe lá dentro: teatro pra mais de mil pessoas; cinema 4D; simulador de Fórmula 1; cassino; academia (academia boa, gente; não estou falando de meia dúzia de esteira, não); biblioteca (essa, sim, normalmente é meio fraca). Enfim, uma cidade flutuante. Eu mesmo, que, juntando todo o tempo que já estive a bordo em navios, dá mais de quatro meses, não consigo entender como que consegue caber água e comida pra mais de 5.000 pessoas e ainda o esgoto dessa gente toda. Mesmo tendo mais de dez andares, ainda olho praquilo e não consigo entender muito bem como aquela engrenagem turística funciona de modo tão perfeito.

Pelos corredores externos da mesquita.

O segundo navio de cruzeiro em que viajei na vida tem algo de muito especial pra mim. No início de 2019, eu tentei muito ganhar uma viagem de seis meses por metade do mundo participando do processo seletivo do site Youjou. Passei apenas na primeira etapa, senti aquela frustraçãozinha, mas, com poucos dias, eis que o destino me dá a oportunidade de uma vida de fazer uma grande viagem de navio que começou em... Caia pra traz e morra: Dubai (!). E terminou em... Ressuscite e morra de novo: Tóquio (!). 28 dias, com tudo pago. Alguns desses destinos pra onde o navio foi possuem um texto exclusivo. No entanto, sobre alguns eu não tenho muito o que dizer, pois, numa viagem de navio, acabamos ficando por poucas horas numa cidade. Em muitas cidades, o MSC Splendida ficava por apenas um dia. Em Mascate (ou Mouscat), por exemplo, capital do Omã, chegou às 7h da manhã e saiu às 16h. Talvez você até considere que nove horas seja um tempo bom pra se conhecer uma cidade. Eu também acho que dá, dependendo do lugar. Só que diminua dessas nove horas o tempo que a gente perde pra levantar da cama, por não conseguir acordar tão cedo; mais o tempo de se deslocar dentro do porto; passar pela imigração; tentar entender onde a gente está; trocar moeda, se for o caso;  escutar os taxistas que vêm te abordar; desconfiar de todos eles; tentar encontrar algo mais barato; e ainda pensar que é preciso chegar ao navio uma hora antes de ele sair, já se foi metade do tempo.


Em Mascate, as ofertas dos taxistas eram 25 euros a hora, podendo chegar a 20 euros. Depois de se afastar um pouco do porto, encontramos o Ramanãn, que aceitou 120 dirhams (R$140,00) mais US$20,00 (R$80,00). Ou seja, R$260,00 em vez de R$375,00 dos primeiros taxistas. E ainda bem que no Omã os taxistas estavam aceitando moedas estrangeiras porque, assim, não precisava trocar o dinheiro de novo e, logicamente, perder dinheiro de novo.

É sempre MUITO bem recomendado que você se planeje para chegar uma hora antes de o navio partir, por segurança. Ainda mais se você estiver num outro país. SEGUE ESTE MEU CONSELHO: chegue uma hora antes, pelo menos, pra evitar quaisquer imprevistos. Esse aviso é de alguém que já perdeu um navio uma vez. Se você já perdeu avião alguma vez, acredite: navio é bem pior. Quer saber como foi? Clique aqui.

O grande lustre do salão principal da mesquita.

Como já era de se esperar, a parada em Mascate foi feita meio correndo, de táxi, preço combinado anteriormente para o taxista ficar por três horas à nossa disposição. Considerando o tempo curto, os deslocamentos e a vontade de ver o máximo possível da cidade, as descidas do carro eram mais para observar um pouquiiinho melhor os monumentos. A visita um pouco mais bem feita foi a da Grande Mesquita do Sultão Qabus, faltando poucos minutos para ela fechar (fechava às 11h naquele dia). Precisa entrar descalço, ou de meias, pisando num forro que protege o tapete. E tinha lá seu lustre surpreendente, que, na hora, até me deixou na dúvida se não era mais bonito do que o da mesquita de Abu Dhabi. Hoje, comparando as fotos das duas, não acho. Depois de visitar o templo, procure por uma salinha onde eles oferecem água, tâmaras e café GRÁTIS, bem como livros em várias línguas que falam sobre o islã, que você pode levar, “mas só pode 1 ou 2”. O meu eu ainda não li.

Pra pisar nesse chão, só delcalço ou de meias.

O teatro da Casa da Ópera é outro ponto que os turistas vão. Dá pra fazer a visita guiada por 3 OMR (omani rialis) para conhecer curiosidades do teatro e ver outras peças também curiosas, como flautas de materiais estranhos e figurinos de ópera, tudo em 15 minutos. Esse era o único jeito de conhecer o prédio por dentro. O teatro principal, de 1.100 pessoas, foi construído inspirado “no Omã antigo, mas usando a tecnologia atual” – adorei quando a guia falou isso. O restante dos monumentos, só passamos na frente ou descemos pra dar uma olhadinha por fora mesmo.

Incensário visto de dentro do táxi.

Encerramos o passeio no Mutrah Souk, um dos mercados mais antigos do país, mas não comprei nada lá. Os vendedores também avançam abordam todos os turistas, e vão baixando o preço, se você não quiser levar de cara. Dizemos "adeus" ao nosso taxista guia e, como é de praxe, encerramos em algum lugar pra usar wifi, já que internet de navio... Você $abe, né? Então eu me atualizava usando a rede sem fio de algum restaurante ou loja onde eu parasse. Reservei um tempinho do fim do passeio para sentar num restaurante com wifi. Na primeira opção, pedi a coisa mais barata e pedi a senha. O atendente me disse que só liberaria a internet com uma consumação mínima de 8 OMR. Andei um quarteirão, e comprei uma Coca por 0,3 OMR e um sorvete por 2,5 OMR. Em abril de 2019, 1 rial omanense correspondia a mais ou menos R$10,00.

Mutrah Souk.

 Já a bordo, voltei a contemplar a visão paradisíaca que me impactou quando cheguei. Do convés, dava pra ver o incensário, o forte, as edificações da cidade (todas brancas) e a paisagem desértica e cinzenta das montanhas secas, pedregosas e pontudas, rodeando a cidade branca. Mesmo com poucas horas lá, a visão que eu tinha de Mascate desde o navio é que foi a mais linda:

Mascate vista do convés do navio.

Antes de toda essa experiência nova no Omã, o Splendida parou nas Ilhas Sir Bani, mas foi uma parada mais sem gracinha, talvez porque já criamos (ou pelo menos eu é que criei) o hábito de viajar a algum lugar e querer aproveitar cada segundo visitando tudo o que se tem pra visitar. Aí, quando se chega a uma ilha onde a única coisa a se fazer é observar o mar, nadar numa área limitada e cheia de pedras na areia, ou dançar com a equipe de animação sob um sol super escaldante, talvez dê uma brochada mesmo. Muitos passageiros nem desceram do barco ou desceram e já voltaram em poucas horas.

Neste lugar, as opções de passeio que havia eram pagas, então fiquei somente na área reservada pela MSC Cruzeiros.  Eu até achei bom ficar deitado nos sofás e almofadas que a equipe do navio preparou pros hóspedes sob uma tenda na praia. Só faltou uma água de côco, mas achei que meu dinheiro não merecia o desaforo de eu usar R$40,00 num côco.

"Preço especial: 8 euros".

Sem muito o que se dizer sobre esse destino, partimos pro próximo lugar, que foi o Omã. Só que era pra termos parado em Khasab antes de Mascate, mas tivemos outra frustração, porque o Splendida teve de saltar esse destino, fazendo uma pequena mudança no itinerário devido à morte de um passageiro. Pra quem acredita em destino...

Itinerário de um cruzeiro de quase um mês.


quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Império


“A União é meu desejo e o objetivo que almejo, para o benefício dos povos dos Emirados”
Zayed Bin Sultan Al Nahyan

Eu na frente da Grande Mesquita Sheikh Zayed...

...olhando os grupos de turistas tirando foto na frente dela.
Uma vez conheci um turco que acha a Grande Mesquita de Abu Dhabi uma das coisas mais sem graça que ele já viu. Talvez por ele ser de Istambul e já estar acostumado a ver mesquita toda hora. Mas, pra mim, achei uma construção muito interessante e imponente. Ao contrário da maioria das igrejas católicas barrocas, que também acho imponentes, a Sheikh Zayed Grand Mosque tem um visual mais limpo e neutro, sem aquelas tantas esculturas e pinturas dos templos católicos. Mesmo assim, achei que tinha muitos detalhes pra se observar, como as flores de mármore nas paredes, os quatro minaretes de mais de 100m de altura, os detalhes das 82 cúpulas, um lustre de 12 toneladas sobre um tapete de tamanho correspondente a nem me lembro mais quantos campos de futebol e que pesa mais de 30 toneladas e que levou não sei quantos anos pra ser feito. Disseram que esse tapete era de peça única, mas, pra mim, não tinha muita lógica ele ser assim, fiquei meio desconfiado. Todo esse exagero Toda essa grandiosidade, segundo alguns, é porque a arte islâmica é capaz de transformar o Deus invisível em algo visível. Julgando pelo visual dos templos católicos e até de alguns templos evangélicos, talvez seja esse também o pensamento das outras religiões.

Pátio da mesquita.
Lustre de uma das salas de oração.

O mais engraçado, pra mim, foi que isso tudo me deu a impressão de estar entrando num patrimônio milenar da humanidade, mas na verdade a mesquita é super nova. Levou 11 anos pra ser construída e ficou pronta em 2007. As visitas guiadas pelo local saem a cada hora, duram quase uma hora e vale a pena esperar. Quando você viaja pra um lugar que tem uma cultura muito diferente da sua, é bom se atentar às regras antes. Pros homens: não usem regatas, mas também não precisa ser camisa de manga comprida. Se sua bermuda cobrir seu joelho, tudo bem você ir com ela. É por isso que, quando viajo, sempre levo minha calça que vira bermuda – por causa das mudanças de temperatura e por regras de vestimentas de alguns espaços. Já pras mulheres, se eles acharem que sua roupa é um pouquiiiinho indecente, já vão te cobrir com uma túnica e você deverá ter os cabelos cobertos durante a visita toda. Vi uma senhora que tirou uma foto com a cabeça descoberta dentro da mesquita. A funcionária pediu pra ela apagar a foto. Atenção: antes disso tudo que eu falei, quando o taxista te deixar lá na frente, não vá direto para o prédio da mesquita em si. Na frente dele, tem uma casa de formato oval, que é o centro de visitantes. Você precisa entrar lá, pra fazer seu registro, imprimir seu bilhete de entrada, e pegar emprestado um traje “decente”, se for o caso. O banheiro é algo bem curioso. Não existe vaso, mas um buraco no chão, como muitos banheiros nos Emirados. E existe um lavatório central, pra você se sentar e lavar seus pés, algo comum também de se fazer antes das orações.

Salão principal e seu lustre e tapete incríveis.
Área do banheiro reservada pra lava pés.


Horizonte de Abu Dhabi no verão.
Tanto em Abu Dhabi quanto em Dubai, olhar o horizonte é uma coisa tão estranha, porque parece ter sempre uma névoa pesada, que não te deixa ver claro o que há ao longe. É como se sua vista estivesse sempre embaçada. O calçadão, à beira da praia, lá eles chamam de Corniche. Nem pense em andar sem camisa – é indecente.

Abu Dhabi e Dubai são separadas por uma hora e meia de viagem de ônibus. Na rodoviária das duas cidades, não consegui comprar a passagem com cartão de crédito, o que me surpreendeu muito, porque, com toda aquela arrumação, tecnologia e bando de pessoas ricas andando pra lá e pra cá, não imaginei que eu tivesse de ir a um caixa automático pra sacar dinheiro pra conseguir comprar a passagem. Os taxistas lá me pareceram honestos. Na rodoviária, perguntei: “Moço, quanto aproximadamente dá uma corrida até o Palácio Presidencial?”. Ele disse: “Uns 26 ou 27 dirhams”. Deu AED28,00 e não parecia que estavam dando voltas comigo. Eles só viajaram na maionese ao dizerem que não paga pra entrar no Palácio. Na verdade, se você quiser ir somente à biblioteca é que você não paga. Mas, pro Palácio Presidencial, Em Abu Dhabi, se paga AED60,00, incluso o show de som e luzes, projetados no Palácio, mais ou menos às 21h.

Entrada da biblioteca do Palácio.
Dentro da biblioteca. Entrada gratuita.

Esse Palácio, chamadoo Qasr Al Watan, ou Presidential Palace, é bem impressionante, e tem um esquema bem rigoroso pra se entrar. Não pode entrar com comida na bolsa, mesmo que você jure não comer lá dentro. Até meu guarda chuva ficou pra trás e minha garrafa d’água. Mas é lógico que não mandei na-da pro lixo. Consumi tu-do ali na porta, mesmo sem vontade. Se tivesse tecla SAP pros olhares dos árabes que me viam comendo aquele tanto de coisa sem nexo na porta de um palácio, eu traduziria como: “Que coisa de pobre!”.

Interior do Palácio Presidencial.
Pátio do palácio.






Os turistas ainda mal conhecem esse Palácio. Foi aberto a visitação há um ano apenas, e você pode conhecer a biblioteca, o grande salão e a grande variedade de mosaicos, e outras salas de exposições que contam sobre a história dos donos da porra toda sheikhs. A estrela de oito pontas que aparece bastante nos mosaicos é um desenho muito frequente nas artes árabes em geral. O bom dessas exposições é que elas eram pequenas e bem objetivas, então, a gente ainda consegue sair com a sensação de que viu “tudo”. Não podia faltar um lustre de 12 toneladas também, pra provar a fixação que essa gente tem por essas grandes luminárias. Pena que, neste dia que eu peguei o ônibus de Dubai pra Abu Dhabi, cheguei a Abu Dhabi às 16h e saí do Palácio às 19h45. Então tive pouco tempo pra revisitar o Emirates Palace, outra obra arquitetônica megalomaníaca de quem tem complexo de pau pequeno grandiosa e maravilhosa que só eles sabem construir. Ah, calma. Vou te contar do primeira vez que eu fui ao Emirates Palace.

Dentre as coisas que se vende na loja do
Palácio Presidencial...
... estão os chocolates feitos com leite de camelo.























Docinho de R$60,00 na "lanchonete"
do Emirates Palace.
Bem, visitei o Emirates Palace, um hotel que você pode entrar sem ter feito reserva e onde você pode tomar um café com folhas de ouro em cima do creme (não lembro o preço), ou escolher que tipo de luz você quer quando entrar no banheiro (pelo menos mijar eles te deixam ir de graça). Se quiser reservar um quartinho, a diária do mais barato é AED6.000,00 (não errei na digitação. É seis mil mermo). No saguão, em frente à cafeteria, havia arpistas que tocaram durante MUITO tempo. Acabei passando a tarde toda ali. Estava me sentindo tão rico... Talvez, pode acontecer com você de o segurança não te deixar entrar de bermuda e chinelo, mas eu vi pessoas lá dentro vestidas assim (talvez fossem hóspedes, então estavam pagando, então podiam... Não sei). Ainda bem que, na dúvida, sempre visto minha calça que vira bermuda (sim! Ela de novo. Tô até pensando em fazer um texto só pra ela), então foi só emendar as partes que cobrem a canela com um zíper e estar vestido apropriadamente pra entrar.








O banheiro de árabe é bem diferente do da sua
casa, que mais parece banheiro de indigente
Ao tirar suas fotos nesses países, é sempre bom tomar cuidado para que as pessoas não pensem que você está tirando foto delas e se sintam desrespeitadas. Se tirar foto de alguém, faça-o MUITO discretamente. Comigo mesmo aconteceu, ao chegar a Dubai, de estar acontecendo uma chuva artificial, que eu nem sabia que existia. O segurança do shopping me disse que eu não poderia filmar a chuva. Eu realmente tive sorte de ver uma chuva esse dia, porque, não sei se você tinha se dado conta, mas Abu Dhabi é um de-ser-to. A gente olha todos aqueles arranha céus e carros luxuosos e lojas de grife e esquece que esse império todo foi construído em cima da areia. Ah! Mas tem sempre uma coisa pra te lembrar: quando você pisar pra fora do hotel, o calor de 48 graus (em julho) vai te fazer pensar que foi o satanás que abriu a porta pra você. Não pense que à noite fica mais fresquinho, porque a sensação de estar perto do capeta é quase a mesma, até de madrugada. Claro que no inverno não é tão assim, a média é de 30ºC. Tem dia que faz até uns 20 grauzinhos.


Claro que não. Nos Emirados eles cagam chique, meu amor. 
Se você chegar de navio de cruzeiros, fique atento ao serviço gratuito de ônibus que, do porto, te deixa no Abu Dhabi Mall. Em Dubai, a mesma coisa. Aí é melhor se, do shopping, você pegar táxi pros locais onde quer visitar. Os preços abaixo são de julho de 2019:

Quanto tirei do bolso? (hoje 1AED = R$1,60)
Táxi de Abu Dhabi Mall até a Grand Mosque – 17km – AED44,00
Salada num restaurante da Marina Mall – AED24,00
Táxi da Marina Mall até o Palace of the Emirates – 2,5km – AED 15,00 (também achei esquisito; depois é que eu percebi que esse motorista deu volta)
Táxi do Palace of the Emirates até o terminal de cruzeiros – 11km – AED26,00
Ônibus Dubai – Abu Dhabi AED29,00 – Pergunte sobre descontos para idosos, se for seu caso.
Táxi da rodoviária de Abu Dhabi até Palace of the Emirates – 8km – AED28,5. O caminho reverso custou AED26,00. O taxista tentou nos convencer a pagar AED250,00 pra nos levar até Dubai, mas, mesmo que a passagem de ônibus da volta já não estivesse comprada, não valeria a pena. A gente não tinha essa pressa toda.



Os táxis têm tarifas fixas. Você as encontra fácil em qualquer veículo.

quarta-feira, 15 de setembro de 2021

Sangue e Areia


“A Unidade é o caminho para a força, honra e poder. Já a divisão nos torna frágeis.”
Zayed Bin Sultan Al Nahyan, príncipe de Abu Dhabi desde 2004


Primeira surpresa num supermercado em Dubai.

Maçã verde, morango, limão, mojito, maçã e morango de novo, e romã, podem ser sabores de bala ou chiclete – Isso pra nós, mas, pra quem mora em Dubai, também é opção de sabor de cerveja. Eu já tinha visto essa exoticidade alimentar também na Europa, e é isso que mais me fascina quando viajo – experimentar sabores novos, e ver o diferente nas coisas cotidianas.

Outra mudança de perspectiva:
chamar pessoas com deficiência de
"pessoas com determinação".
Pra se conhecer bem a história de uma cidade, acho que ir a um museu é tão importante quanto conversar com quem mora lá. O Dubai Museum, entrada R$3,00, conta mais das histórias da época em que a cidade era só uma vila de pescadores e ainda não estava sob a gestão de Sheikh Zayed, a quem a população de Dubai agradece por tudo o que a cidade se tornou e representa hoje. Concluí isso pelo pouco que conversei também com moradores locais, espacialmente taxistas. Pelo que eu entendi, foi esse milksheike que estabeleceu uma convivência mais pacífica e tolerante entre os moradores dos Emirados, ao receber sem distinção diferentes culturas, raças, religiões e costumes, ao mesmo tempo, sem abandonar a identidade cultural dos nativos. Talvez por isso Dubai seja uma cidade tão bagunçada cosmopolita. Eu adorava ver árabes, judeus, mulheres cobertas até os olhos e mulheres de shorts, tudo no mesmo ambiente e convivendo em paz. Eles entendem tanto essa importância de as pessoas conviverem bem com as diferenças, que lá existe até um cargo político chamado de Ministro da Tolerância. Sinceramente, espero que esse comportamento se espalhe por todo mundo. Imagine você morar numa cidade onde haja 200 nacionalidades, e todos estejam em harmonia. Um taxista me disse que assalto em Dubai é uma coisa raríssima.




Logicamente há várias controvérsias ao segundo parágrafo deste texto. Assista no youtube ao documentário “O lado obscuro de Dubai” (já coloquei o vídeo aqui pra adiantar seu serviço) e veja situações de pessoas que foram desumanamente exploradas para que aquela cidade se tornasse tudo o que é hoje. Já vi também relatos de habitantes de Dubai dizendo que as coisas não são tão bonitas assim como a imagem que fica pra quem é turista. Então pode saber que houve (talvez ainda haja) muito sofrimento oculto debaixo de todas aquelas maravilhas que fizeram em cima da areia.


Vendedor tentado me convencer
a comprar um traje árabe
Conseguiu!
























Vitrine de uma loja no Mercado de Ouro
Sair às compras em Dubai é quase que passear na 25 de Março (São Paulo), só que, lá, você pagará os IOF’s de 6,38% do total da compra, se usar cartão de crédito. Os vendedores Dubaienses têm faro pra identificar turista, então já pulam em você oferecendo relógios, bolsas, trajes muçulmanos e, mesmo que você relute muito, eles acabarão te mostrando algo que te agrade. Sempre sendo chatos insistentes, eles tentam puxar conversa perguntando nossa nacionalidade. Ao ouvir “Brazil”, logo dizem: “Neymaar! Ronaldo!”. Eu mesmo resolvi vestir uma daquelas roupas de homem bomba homem árabe, “só pra tirar foto”, eu disse ao vendedor. Só que achei aquele batina branca de um tecido tão gostoso, que resolvi comprar. Sério, eu não conseguia parar de alisar aquele pano. Havia uma família de alemães na loja que estavam comprando também e achei que ficaríamos bonitinhos juntos na mesma foto. Gastei o equivalente a R$80,00 no traje completo. Até hoje estou esperando uma festa a fantasia pra inaugurar minha roupa nova. No mercado, aproveite para comprar tâmaras e pistaches, que são bem mais baratos do que no Brasil. E tudo dá pra pechinchar. Essa área de que falo é na cidade antiga, onde estão o mercado velho, o mercado de ouro, o mercado das especiarias, dos colchões, dos utensílios e tantos outros. É como dois grandes grupos de mercado separados por um rio. De um lado, o mercado novo; do outro, o mercado velho. Tem vários barquinhos (chamados de “abra”) que fazem essa travessia, e saem no máximo a cada 15 minutos. Procure por aqueles que custam apenas um dirham, ou seja, um real - pra mim, que fui em julho de 2019. Hoje um dirham vale R$1,60, então todos preços que vir aqui são de quase um ano atrás.

Achei melhor colocar a etiqueta,
pra ninguém achar que estou inventando.
O outro mercado, ou “souk” (se pronuncia súk), é um pouco mais fake planejado e arrumadinho, com ar condicionado e tudo, que combina grandes grifes mundiais com coisas típicas do Oriente Médio e fica ao lado do Burj Al Arab, aquele prédio em formato de barco a vela que qualquer pessoa vê em qualquer revista e já percebe que é Dubai. Dentro do souk é aquele ar condicionado fresquinho, batendo no seu pezinho calçado com as Havaianas que você comprou ali por mais de R$150,00. Mas deixa esse conforto de lado só um pouquinho e saia pro inferno calorzinho do pátio pra tirar uma boa foto de instagramer, depois de desembaçar os óculos e a tela do telefone de tanta humidade que tem no ambiente externo. Dubai é assim mesmo: saiu de qualquer lugar pra rua, seus óculos já viram uma tampa de marmita. Até acho que vale a pena continuar ali no forno externo pra conhecer o restante do mercado. O lado de fora é ainda mais lindo que dentro. Depois você volta pro ar condicionado pra continuar suas comprinhas, mas, se estiver na hora da reza, não incomode o vendedor. Os muçulmanos fazem muitas orações por dia, acho que cinco. Em vários momentos por dia você escuta anúncios em alto falante em QUALQUER lugar, lembrando a todos que está na hora do terço (não sei se é bem terço que eles ficam rezando, mas entendeu, né?). Então não tem jeito: mesmo se você quiser comprar esse tapete aí, que custava R$80.000,00, vai ter de esperar o carinha tirar o joelho do chão. 






Espere o vendedor acabar a reza...
...pra você comprar este tapete de R$80.000.

No trem, melhor andar na linha.
Esse mercado de que falei até agora se chama Souk Madinath Jumeirah e não fica tão próximo da estação de metrô, então é melhor pegar o ônibus. No metrô, não coma, não beba, nem masque chiclete nem dentro nem fora do trem, nem dentro de qualquer estação, porque tem multa de mais de R$100,00 se você fizer isso. Eu vi uma fiscal autuando um cara por estar mascando chiclete. Ela pediu pra ele sair do vagão e acompanhá-la. Imagino que estivessem indo conversar com alguma autoridade. Ele não brigou, apenas saiu acompanhando-a. Entre outras multas que você corre o risco de receber estão a de atravessar a rua em local proibido (R$1.000,00).







Se quiser ainda programas baratos ou grátis em Dubai, existe um tal de Gents’ night e Ladies’ night (Noite dos Cavalheiros e Noite das Damas). Alguns bares oferecem, em certos dias da semana, um certo horário de consumação de bebida alcoólica grátis seja pra homem ou pra mulher. Eu não cheguei a ir a nenhuma dessas festas, então não sei dar opinião. Mas dê um Google quando for sair à noite lá.



Burj Khalifa...
... durante o show das luzes...       
... e ao anoitecer.















Atualmente o prédio mais alto do mundo está em Dubai. Sinceramente, eu acredito que, futuramente, o prédio mais alto será em... Dubai também, porque a síndrome megalomaníaca lá é tão grande, que eu já vi no shopping a maquete de um projeto de construção de um prédio, que será ainda maior que o Burj Khalifa, que já é o maior do mundo, nem cabia na minha foto. Eu não entrei nele, mas o visitei por fora. É melhor ir à noite, que é quando acontecem os shows de luz, som e água a cada meia hora, das 18h às 23h, na Dubai Fountain.  Cada show dura quase dez minutos e é diferente um do outro em tudo: nas projeções do prédio, na trilha sonora e no movimento das águas da fonte. Depois de um tempo tentando fazê-lo caber na tela do meu celular é que Alá me iluminou e eu tive a brilhante ideia de tirar uma panorâmica, de baixo pra cima. Juro: eu nunca tinha pensado nisso. Dá pra ficar ali um bom pedaço da noite e, nos intervalos, passear no Dubai Mall, shopping ao lado, que você encontrará de tudo, até com o brinquedo dos seus sonhos, com quem você poderá dormir abraçadinho:


Banheiro masculino do Dubai Mall.
Não! Não precisa pagar.
Mesmo com tantas variedades de tudo pra se comprar, você verá que as mulheres de lá não variam tanto o guarda roupa quando saem pra rua. Ou o “pretinho básico” tava realmente MUITO na moda quando eu fui lá. Era muito engraçado vêr as muçulmanas cobertas dos pés à cabeça, entrando em grupo nas lojas de grifes mais caras para olhar os sapatos e vestidos. Ouvi dizer que elas compram, mas só usam em casa, para os maridos. E não é qualquer coisa. Eu perguntei o preço de algumas peças e tinha vestidos de R$15.000.  Nesse shopping, até mijar pode ser um momento que merece um registro. Espero que te dê vontade de ir ao banheiro lá, porque até isso é in.crí.vel.





O lugar que mais me deixava curioso em Dubai é o Palm Jumeirah, aquela ilha pertinho da praia que é um aterro em formato de palmeira quando se olha de cima. Infelizmente o acesso até lá é difícil. Fui de táxi e só desci pra tirar foto mesmo, em frente ao hotel Atlantis On The Palm. Isso tudo que conto aqui fiz em quatro dias. Mas, e se você estiver em Dubai apenas em conexão e não puder sair do aeroporto? Se for pelo menos quatro horas de intervalo, eu arriscaria sair mesmo assim, porque tem uma parada de metrô DENTRO do aeroporto e os mercados que eu mencionei estão apenas a seis estações de lá. Mas se você estiver com medo de perder alguma conexão, dá pra fazer assim: procure no aeroporto pelos selfie spots. São adesivos no chão que têm uma tecnologia 3D que te permite tirar uma foto como se estivesse mesmo no local. Caso você não resista à vontade de querer causar uma invejazinha nos amigos, tem essa opção.

Burj Al Araba visto do
Souk (mercado) Madinath Jumeirah...
Mesmo souk, do lado externo.
Gostei tanto que voltei.


O que tirei do bolso? (1AED = R$1,60 hoje)
Café no Dubai Mall – AED15,00;
Duas saladas e uma cerveja no restaurante do Souk Madinath Jumeirah AED80,00;
Táxi da Dubai Marina para Palm Jumeirah e de lá para Souk Madinath Jumeirah, passando pelo Burj Al Arab – AED62,00;
Uber do shopping Mall of the Emirates até o terminal de cruzeiros – 24km – AED65,00. Foi aí que percebi que Uber não fica mais barato que táxi lá;
Táxi do Dubai Mall até o terminal de cruzeiros – 12km – AED37,00;
Ah, pra entrar no Burj Al Arab, só com reserva no restaurante.

DICA DE TRANSPORTE PÚBLICO. Pra mim, ter o passe de metrô acabou compensando mais do que os táxis. Eu experimentei tudo: primeiro eu paguei por cada viagem, ou seja, single ticket. Ao fim do dia, percebi que teria compensado mais se eu pegasse o passe diário e foi isso que fiz no dia seguinte. Cuidado! O passe diário não vale por 24 horas, mas só por aquele dia mesmo, ou seja, à meia noite seus créditos expiram, mesmo que você tenha comprado o bilhete no fim da tarde. Depois de uma tentativa frustrada de pegar um ônibus e acabar tendo de gastar de novo com táxi, percebi que o melhor era ter o passe livre, que serve pra metrô e ônibus.

Em Dubai, até eu fico com cara de rico.