segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A Mão de Deus

“Era uma vez um Aleijadinho
Não tinha dedo, não tinha mão
raiva e cinzel, lá isso tinha,
era uma vez um Aleijadinho,
era uma vez muitas igrejas
com muitos paraísos e muitos infernos,
era uma vez São João, Ouro Preto, Mariana,
Sabará, Congonhas
era uma vez cidades
e o Aleijadinho era uma vez.”
                                    Carlos Drumond de Andrade
Praça Reinaldo Alves de Brito vista da Casa dos Contos.
Embora a religiosidade seja tão latente na cidade de Ouro Preto (a 100 km de Belo Horizonte), já ouvi várias pessoas (entre turistas e moradores) dizendo que a cidade tem uma atmosfera pesada, repressora. Alguns dizem que foi por tanto sangue derramado por causa da corrida do ouro, da escravidão, da perseguição aos inconfidentes. Morei em Mariana, cidade vizinha, por 24 anos, visitava Ouro Preto com freqüência por motivos de trabalho e estudo e digo que “nunca tinti nada”. Dancei no grupo ouropretano Rés Cia de Dança e, com frequência, nós fazíamos performances interativas com a arquitetura da cidade. Um dos nossos espetáculos aconteceu na escadaria do prédio rosa, que aparece em destaque na foto acima.
Rés Cia de Dança, no espetáculo de rua "Caminhos e Vertentes".
Ouro Preto (OP) foi declarada pelo UNESCO patrimônio da humanidade em 1980 e é a primeira cidade brasileira a receber esse título. Do mirante do campus principal da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), no Morro do Cruzeiro, você consegue visualizar de uma só vez todo o barroco da cidade, só que não é algo muito bonito, porque enxergam-se as casas novas no meio de tudo e a sensação que se tem é de uma poluição visual. Por um tempo, a cidade cresceu desorganizadamente, então, de determinados pontos, a visão não é puramente histórica. Gosto mais da vista a partir do mirante da Casa dos Contos. No século 19, toda moeda que circulava no país era feita lá.
Dizem que um dos inconfidentes morreu nesse prédio.
A Casa dos Contos é o único museu do Brasil que funciona todos os dias, entrada gratuita. Já foi prisão e casa de fundição de moedas. Contém exposições de moedas antigas do Brasil, objetos e documentos antigos.
Fachada do Museu da Inconfidência e árvore de natal.
O Museu da Inconfidência também possui um grande acervo de objetos religiosos e do cotidiano, que ajudam a contar a história da Inconfidência Mineira. Um painel computadorizado e interativo ajuda a fazer isso de forma lúdica. Os restos mortais de todos os inconfidentes estão lá.
Museu da Inconfidência (lateral).
Os horários de funcionamento, preço da entrada e outras informações sobre os museus citados ou não no meu texto você obtém no site http://www.museusouropreto.ufop.br/. Mas só de andar pela cidade, a gente já se sente num museu. Em 2005, foi inaugurado o Museu Aberto Cidade Viva – instalaram placas explicativas com texto em português e em inglês nas fachadas das residências e prédios que carregam importância histórica pra cidade, principalmente as igrejas.
Eu em apresentação no interior do Museu em 2008.
Em Ouro Preto, em todas as igrejas que visitei eu fui proibido de fotografá-las por dentro, exceto a Nossa Senhora do Carmo. Como entrei enquanto acontecia um casamento, isso não pode ser controlado. No adro da Igreja do Carmo, está o Museu do Oratório, com mais de 160 oratórios. Há taxa de visitação. Atrás disso tudo está o Museu da Inconfidência. Então, dá pra se gastar um dia todo nesse complexo, sem precisar subir e descer todas aquelas ladeiras.
As pinturas não eram de Aleijadinho. Essa é das mãos de Ataíde.
Depois de bater perna por todo aquele conjunto de ladeiras barrocas, sugiro almoçar no Acaso 85, R$27,00 sem balança, que vale a pena pelo seu interior, realmente de uma beleza impressionante, a começar pelo chão da recepção. Se você estiver com pouca grana e for época das aulas da universidade, pode ir a algum restaurante da UFOP (são dois em OP e um em Mariana) e pagar menos de R$5,00 pelo almoço no “bandeijão”.
Interior do restaurante Acaso 85.
Na Igreja Nossa Senhora da Conceição está localizado o Museu do Aleijadinho. Muitas das belezas que vemos na cidade são graças a esse ouropretano, que, dizem, perdeu vários dedos das mãos no fim da vida e trabalhava usando só o polegar e o indicador. Ele trabalhou muito a pedra-sabão e várias das suas obras podem ser vistas também em Congonhas, a 80 km de Belo Horizonte.
Igreja da Conceição e Ponte dos Suspiros.
Se você não tiver tempo de visitar todas as igrejas, dê prioridade para a Nossa Senhora do Pilar, a mais bonita na minha opinião, com várias obras feitas pelas mãos de gangrena e lepra de Aleijadinho também. Outros artistas também participaram da ornamentação desse e outros santuários de OP, mas Antônio Francisco Lisboa (seu nome de batismo) é o mais lembrado. Teoricamente, não pode ser fotografada, mas eu fui no horário da missa e bati uma foto discretamente, sem ser visto. Tsc Tsc, desobedecendo a lei, que pecado... Anexo, há um museu de arte sacra, aberto de terça a domingo. A Igreja do Pilar está entre as duas mais bonitas que já vi na vida. A outra foi em Pernambuco, e tem uma foto dela no texto do blog de junho de 2011.
A foto proibida.
Em Ouro Preto, Cachoeira do Campo e região o artesanato que você mais encontrará é o de pedra-sabão. Obras de todos os tamanhos, com preços variando de R$1,00 a milhares de reais, e que agradam a todos: esculturas românticas, abstratas, de times de futebol, de animais, e também objetos com alguma funcionalidade, como porta joias, porta retratos, jogos de damas e xadrez.
A peça da feira que mais me chamou a atenção (R$1.200,00).
Não fiz pole dance na cruz, mas, nas ruas de Ouro Preto, eu fiz.